4 EQUÍVOCOS DE CONSULTORIA NO MERCADO



Eu comecei a trabalhar em uma empresa aos 17 anos, no almoxarifado de medicamentos e materiais hospitalares. Minha função era despachar, controlar e receber os itens, além de apresentar os balanços. De lá para cá se passaram 34 anos e eu sempre estive no ambiente empresarial, quer seja em instituições familiares ou profissionalizadas. Fui estagiário de uma empresa de alugueis e partilhava com os demais funcionários o lanche de café, leite, pão e manteiga, fui trainee e consultor da KPMG, uma multinacional com sócios ingleses, alemães e americanos, fui gerente em uma empresa, fui diretor em outra, procurei me capacitar com cursos no Brasil e no exterior e, somente aos 48 anos resolvi prestar consultoria, depois de ter lido muitos livros e artigos, assistidos muitas aulas e ter acumulado experiência prática. A consultoria é intrínseca à senioridade, creio eu. Não trata-se somente de informação, mas sobretudo de sabedoria.

A necessidade faz a oferta, e hoje em dia podemos ter consultores de todos os tipos e preços. Existem até profissionais de outras áreas fazendo recomendações para clientes sobre gestão e recuperação empresarial.  As vezes tenho a impressão que ocorre mesmo é  imitação, o que exige cada vez mais o estabelecimento de vantagens competitivas consistentes, mesmo sabendo que só é imitado quem é admirado. O mercado tem destas coisas e cabe ao cliente escolher o que melhor lhe aprouver, porém é preciso ter cuidado para não amargar prejuízos no médio e longo prazos, acatando orientações que não geram sustentabilidade organizacional, algo que nem todos sabem o que é.

Neste post, vou discorrer sobre quatro exemplos que segundo meu entendimento, representam bem alguns equívocos cometidos por profissionais que estão prestando consultoria para empresas no mercado:

1.       TIRAR TODA A  FAMÍLIA DA GESTÃO DE EMPRESAS FAMILIARES

Este é um mantra repetido por muitos: Empresas familiares precisam ser profissionalizadas e todos da família devem ser afastados. Sem isso elas vão perecer e todos os motivos dos seus problemas se devem a isto. Ora, das mais de 19 milhões de empresas ativas no Brasil, 90% são familiares, estando 15 companhias entres as maiores empresas familiares do mundo, incluindo o Itaú, a JBS, a Gerdau, a Votorantim, a GOL e até a Magazine Luíza.  No planeta, as empresas familiares juntas somam “US$ 6,5 trilhões (aproximadamente R$ 19,7 trilhões) de rendimentos anuais, o suficiente para serem a terceira maior economia do mundo. Ficariam atrás apenas dos Estados Unidos e da China. As companhias, combinadas, empregam 21 milhões de pessoas.”  Principalmente na primeira geração, onde o fundador está atuando, como afastar todos da família e colocar “estranhos” em seus lugares ? Coloque-se no lugar do empresário, e me diga se você tiraria todo o seu pessoal e colocaria no lugar “profissionais capacitados”.  E se você responder sim, porque não na sua empresa de consultoria também ? Pois é, o motivo é o mesmo dele.  Na verdade, este mantra pode soar muito bem nos livros e nos textos, mas na prática não se sustenta. Ninguém em sã consciência fará isso de bom grado. Quando o fazem, fazem por forças de circunstâncias fortíssimas. O caminho para resolver estes problemas é outro.

2.       RECOMENDAR OU SUGERIR SOLUÇÕES DE UM CLIENTE PARA OUTRO

Cada empresa tem a sua singularidade. Ela formada pela sua cultura organizacional, seu mercado, suas equipes, suas práticas, seus recursos financeiros e materiais, seu Know-how. Nenhuma é igual a outra. Até as unidades dentro de um mesmo consolidado são diferentes entre si, mesmo sob uma mesma gestão. Uma loja não é igual a outra, uma fábrica não igual a outra, um escritório não é igual ao outro. Então como uma solução que deu certo em um cliente pode ser repassada para outro sem a devida customização ? Na verdade, cada solução para cada cliente é uma ferramenta única, desenvolvida conforme suas características e peculiaridades. Então, essa estória de ficar vendo o que deu certo em um cliente, as vezes até sob a responsabilidade de outro profissional, parece-me bastante curto para não dizer medíocre. A capacidade de concluir e deduzir corretamente, com base em fundamentos consistentes, é uma das principais competências de um consultor. E isso elimina esta prática de copiar e colar soluções empresariais.

3.       USAR MODELOS ESTRANGEIROS SEM ADAPTAÇÕES À CULTURA LOCAL

Quando você vai aos EUA percebe que tudo é diferente daqui, incluindo o sabor da comida, o trânsito, o clima, os tamanhos de camisas, calças e sapatos. Neste caso, para comprar você tem de fazer uma conversão para os tamanhos brasileiros, se não quiser ficar parecendo um espantalho. Não é só a moeda que precisa ser convertida. Os costumes também. Os modelos gerenciais, as teorias e abordagens americanas são sensacionais para o mundo da administração. A mesma coisa são os vindos do Japão. Mas aplica-los diretamente aqui sem um mínimo de cuidado, é querer um tamanho G aqui e lá sejam a mesma coisa. E não é. Muitos profissionais, talvez querendo impressionar o cliente ou muni-lo do melhor já que aqui não produzimos muito, gostam de usar expressões e modelos importados. Mas tome cuidado se eles são realmente efetivos. Haja vista a dificuldade que as empresas brasileiras possuem de adotar o nipônico e disciplinado sistema da qualidade.

4.       FAZER PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO NO AUGE DE UMA CRISE FINANCEIRA

Quando se está no meio de uma crise financeira empresarial, o horizonte de longo prazo é corrido e as pessoas passam a operar no curtíssimo prazo, somente apagando fogueiras e resolvendo os problemas do dia a dia. Não há como fazê-las pensar em missão, visão e valores se elas não conseguem pagar as contas. Em um ambiente assim, como esperar que uma empresa consiga planejar e cumprir suas estratégias sem antes debelar o que lhe aflige ? Como esperar que se concentre no que é importante havendo uma urgência para ser resolvida ? Experimente chegar para um paciente que está sofrendo de dores fortes nos rins e falar que ele precisa começar a beber mais água que daqui a uns meses tudo vai ficar normal.  Isto simplesmente não resolve o problema dele naquele momento, mesmo que seja adequado para um momento seguinte. Saber o timing do cliente é fundamental, assim como identificar o que ele realmente quer independente da dor que o incomoda. Vender uma empresa somente porque está em crise pode não ser a melhor alternativa, mesmo que seja mais rentável para quem faz. Planejar uma expansão sem saber se a empresa tem capital de giro, pode trazer endividamento. Dinheiro não é tudo, lembre disto, mas sem ele não tem nem como pagar o planejamento estratégico necessário.

Se você chegou até aqui no post, pode estar pensado: Puxa Tibério, você apontou os exemplos mas não disse o que é que tem de ser feito. É verdade. Fiz isso de propósito. Pois, como já disse, cada caso é um caso, e se você possui um problema empresarial para ser resolvido, terei a maior satisfação em ajudar, mas será feito especificamente para você e o seu negócio.


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