QUANTO VAI QUERER NA NOTA ?

O Brasil tem uma cultura bem peculiar, é verdade. E residem em seus fatos cotidianos muitos dos motivos dos nossos grandes problemas. Fatos as vezes tão corriqueiros que nem se percebe a real natureza dos mesmos, como por exemplo o mau hábito de emitir notas fiscais para comprovação de despesas, com valores acima daqueles que foram realmente praticados. Ao perceber que o consumidor está a serviço de alguma empresa, o fornecedor pergunta sem a menor inibição quanto ele deseja que conste na nota.
 
Muito comum em hotéis de menor porte, restaurantes e até em táxis que emitem simples recibos, esta prática traz consigo um viés de desonestidade e afeta ambas as partes envolvidas. Senão vejamos. O fornecedor que emite uma nota cujo valor não recebeu por completo, está reconhecendo uma receita inexistente. Por consequência, se for tributado pelo faturamento, estará pagando impostos sobre um montante que não recebeu. Também haverá uma divergência entre o faturamento fiscal e o financeiro, porque o dinheiro não entrará no caixa.
 
A nota fiscal é também uma forma de fundamentar o custo das empresas, através da discriminação do seu conteúdo. Desta forma, registrar uma saída de mercadoria sem ter realmente ocorrido, distorce o estoque e o conhecido custo de mercadorias vendidas (CMV). No caso de serviços, esta relação não seria direta mas nem por isso impossível de ser feita. Mesmo que a nota informe apenas que foi servida uma refeição, para que isso tenha se realizado, tiveram que ser consumidos e comprados vários gêneros alimentícios. Logo, o caminho pode ser descoberto. Os efeitos não param por aí, pois a lucratividade da empresa também vai ser maquiada. A não ser que ela use talões avulsos de notas e recibos somente para este fim, algo que não é incomum, estará mexendo em toda a sua estrutura operacional e também sua estrutura de capital.
 
O consumidor que pede e recebe o documento, também merece a nossa atenção. Primeiro ele está literalmente roubando a empresa onde trabalha, porque a diferença entre o que ele realmente gastou e o que consta na nota, vai para o bolso dele. Por mais eficiente que seja um colaborador, roubar a empresa não é uma boa prática.
 
Trata-se de uma gritante demonstração de pouca ética e um sinal de que outras operações similares podem estar acontecendo com a mesma pessoa. Neste ponto, não existe meio termo. Ou a pessoa é correta ou não é. Por fim, a empresa que recebe as notas e efetua o reembolso, sem saber está aumentando de forma irreal seus custos ou suas despesas. Se puder, certamente irá repassar para seu preço esta parcela. Isto é, no final quem acaba pagando são os clientes. Os mesmos que praticam estes atos.
 
A prática de notas com valores acima do consumo, muitas vezes pode ser justificada por quem faz, como sendo apenas uma fato isolado de valor muito pequeno. Porém, multiplique esse mesmo fato milhares e milhares de vezes, em centenas e centenas de municípios brasileiros, que você vai ter uma ideia do tamanho do problema que ele causa.
 
Artigo de minha autoria publicado originalmente no site ADMINISTRADORES

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