O QUE FAZER COM “O FIM DO BRASIL” ?





Em Julho de 2014, Felipe Miranda, sócio da Empiricus Research, empresa brasileira de pesquisa e investimentos, publicou um material que gerou algum desconforto e reações contrárias, inclusive ação judicial para retirar o conteúdo do  conotações políticas. No texto, em meio a uma estratégia de marketing para vender os seus serviços e produtos, Felipe anuncia uma severa crise econômica que se avizinha fundamentando sua impressão em vários sinais.

1 – Baixo crescimento histórico do PIB com previsões confirmando esta tendência para o futuro. O autor comparou o crescimento atual com as taxas de períodos e de governos anteriores, em relação ao mundo, países emergentes e América Latina, demonstrando que os atuais resultados são realmente ruins.

2 – Inflação persistentemente alta e acima do centro da meta, de 4,5% ao ano. O autor lembra que existem preços represados pelo governo na energia elétrica e no etanol, o que indica um controle artificial da inflação. Ou seja, na prática a pressão inflacionaria é bem maior que os índices demonstram. 

3 – Contas públicas completamente desajustadas e maquiadas pela conhecida “contabilidade criativa”, aumentando a necessidade e dificuldade de financiamento governamental, fazendo com que as taxas de juro subam com vigor, impactando orçamentos de famílias e empresas.

4 – Déficit em transações correntes, originado das relações do Brasil com o resto do mundo, em queda vertiginosa.  O autor acrescenta que a evasão de dólares do mercado brasileiro, pode ser agravada pelas políticas do Banco Central Americano ao enxugar o excesso desta moeda no mundo, ajustando a liquidez aos novos patamares da economia do EUA.

5 – Mercado de trabalho enfraquecendo em ritmo acentuado. Ele ilustra que a criação líquida de postos de trabalho em maio foi de 58.836, segundo dados do Caged, salientando que trata-se do pior mês de maio desde 1992. Lembra que só é considerado desempregado quem está procurando emprego, mas não encontra e afirma que a taxa de desemprego não aumenta mais porque as pessoas têm desistido de procurar emprego.

6 – Riscos de interrupções de fornecimento de energia elétrica. Salienta que analistas apontam possibilidades de racionamento de energia ainda em 2014 devido aos baixos níveis dos reservatórios que podem chegar a 10% em novembro.

7 – Valor da Petrobras sendo continuamente reduzido com aumento acentuado das dívidas da empresa.

8 - Queda de valor da Eletrobrás, causada por baixa rentabilidade causada por atitudes do principal acionista (governo).

9 - Redução da atividade industrial.

Além disso, o autor também ilustra a paralisação nas exportações brasileiras, em relação a outras economias usando dois modelos asiáticos diferentes, praticados na Coreia e na China.

Felipe Miranda responsabiliza a atual política econômica do governo e suas práticas de governança, composta por aumento dos gastos públicos, maior intervenção do Estado na Economia, leniência no combate à inflação, incremento da participação do BNDES, com estímulo à criação e ao fortalecimento de gigantes nacionais, controle de preços, atuações pesadas e frequentes no mercado de câmbio, novos marcos regulatórios em setores estratégicos, distorções na contabilidade nacional e concessões mal feitas.

Para completar, ele cita opiniões de grandes investidores tais como Luis Stuhlberger, gestor do fundo Verde, o maior investidor brasileiro, com histórico impressionante e secular de bons resultados (“Continuamos acreditando na tese de depreciação do real (…). Dá para ficar otimista com o Brasil no médio prazo pelas suas potencialidades, mas aparentemente teremos de passar por uma turbulenta arrumação de casa no caminho. Apertem os cintos!”), Jim Rogers, um dos maiores investidores do mundo, especialista em mercados de commodities e fundador do Quantum Fund junto a George Soros  (“Deveria ser um lugar maravilhoso para investir, mas seu governo segue cometendo erros, colocando tarifas especiais contra alguns de seus melhores parceiros, controle cambial e por aí vai. O Brasil segue fazendo coisas que restringem a economia. Por isso, não estou investindo e não quero investir no Brasil, enquanto tiverem um governo anti-capitalismo ou anti-eficiência. Enquanto tiverem um governo que não entenda a economia eu não quero investir aí. Eu prefiro investir na Rússia. A Rússia não está tomando medidas para desencorajar a eficiência e os investimentos, e o Brasil está. A Rússia tem uma moeda flutuante, o Brasil faz controle cambial.”), e Mark Mobius, da Franklin Templeton, um dos grandes conhecedores mundiais de mercados emergentes (“O Brasil corre o risco de entrar em recessão caso não seja capaz de corrigir pressões que incluem gastos públicos elevados, endividamento dos consumidores e racionamento de energia. A Templeton está menos entusiasmada com as ações de grandes empresas brasileiras.”)

Segundo o autor, esta convergência de fatores gerará no curto prazo disparada da inflação, perda do poder de compra, desabastecimento, aumento destacado do desemprego, elevação dos juros, interrupção do crédito, maior endividamento da população e grande salto do dólar, numa volta às condições desastrosas de antes do Plano Real. Ele até afirma que o país que conhecemos irá acabar, pois teríamos condições sociais, econômicas e políticas bem diferentes das que vivemos nos últimos 20 anos, o que ele chamou de “O Fim do Brasil”.

O planejamento empresarial baseia-se em cenários econômicos. Normalmente, são consideradas abordagens otimistas, intermediários/realistas e pessimistas.  O cenário proposto por Felipe é claramente um cenário pessimista. Logicamente, o pessoal da Empiricus Research pode estar enganado. Mas se não estiver? Quais seriam os impactos nas empresas de uma situação como esta? E o que fazer para minimizar os seus efeitos?  Se Felipe Miranda não estiver equivocado, o quadro desenhado por ele afetará enormemente as empresas de todo o Brasil, sejam elas grandes, médias ou pequenas. Normalmente, as crises punem a ineficiência e quem não se preparou para ela. Por outro lado, as crises premiam a eficiência e quem teve condições de antevê-la, e por conseguinte, se preparou de maneira adequada.  O ideal para qualquer empresa é ficar desse lado da moeda.

As vendas certamente sofrerão pressão para redução, por causa da escolha mais seletiva do cliente, que estará com restrição financeira. Mesmo setores fundamentais como alimentos e vestuário por exemplo, sentirão essa tendência. Em situação de crise, o consumidor tende a eliminar supérfluos e fazer estoques quando possível. Nem sempre é. A volatilidade monetária causada pela inflação, dificultará a identificação de preços adequados, que muitas vezes se comportam de maneira inercial. Ou seja, acompanham a manada. Em contextos assim, onde a quantidade sofrerá redução e o valor sofrerá distorção, os esforços comerciais passam a ter muito mais relevância. O vínculo com o cliente, a fidelização e o relacionamento com o mesmo, tornam-se fundamentais. E já sabemos que atendimento ao cliente e serviços são atitudes necessárias para tal. As ações promocionais também. Nos tempos de crise, esperar que o cliente bata na porta, é quase uma ação suicida. A formação do preço de venda merece atenção especial, para saber se ele, mesmo com efeitos inflacionários, está suficiente para remunerar o negócio.

Os custos e despesas que sempre possuem viés de alta, terão essa característica acentuada. Isso significa que em condições assim, o controle que já é necessário, passa a ser uma questão de vida ou de morte. E quando falo em controle, falo inclusive em controle orçamentário, encaixando os gastos nas possibilidades de pagamento, incluindo as compras. Procurar e eliminar desperdícios e perdas, tornar os processos internos mais rápidos e enxutos, são ações essenciais para reduzir dispêndios operacionais e tornar a empresa mais rápida, mais leve e mais eficaz. Trata-se de fazer mais com menos. De aprimorar o funcionamento e fazer com que cada recursos, inclusive os humanos, gere mais resultados do que os gastos que incorre. Reduções de quadro não estão descartadas, mas pense antes no funcionamento da empresa, para não cortar aquilo que é necessário.

Por conseguinte, o lucro se tornará cada vez mais escasso, fictício e volúvel. Saber qual a necessidade do capital de giro do negócio, será cada vez mais relevante para não desacertar o passo e gerar endividamento a esmo. Na hora de reinvestir, analisar as taxas de retorno das alternativas, na hora de distribuir, não ultrapassar o limite saudável. Identificar tudo isso será vital para lidar com a crise. Projetos duvidosos devem ser descartados.

O caixa de uma empresa determina a sua força. Caixa forte, empresa forte. No entanto, a escalada inflacionária corrói o dinheiro, fazendo com que a alocação de valor em ativos reais seja mais adequada. Neste ambiente, muito dinheiro em caixa, não é sinônimo de saúde financeira. Ter uma gestão atenta e precisa do fluxo de caixa, identificando necessidades e excessos, já é necessário para qualquer época. Numa crise, não ter essa prática é praticamente selar o fracasso do empreendimento.

As contas a receber merecerão atenção redobrada, pois a tendência de alta será forte. O crédito e a cobrança passam a ser funções estratégicas de primeira grandeza, e devem ser acompanhados operação a operação, pois a inadimplência depois de instalada, terá dificuldades de ser revertida, reduzindo ainda mais o lucro da operação. Crédito mais criterioso e cobrança mais incisiva, fazem parte das condutas que a empresa precisa numa situação de crise, e não podem ficar esquecidos no canto de uma sala.

Os estoques passam a ser uma peça ainda mais determinante na sobrevivência da empresa. Quanto mais giro tiverem, mais ajudaram a passar pela turbulência. Estoques com alto prazo de armazenagem, fruto de compras mal planejadas, serão um peso cortante na empresa. A mesma coisa com o imobilizado. Aqueles itens cuja a depreciação for maior que a valorização, serão um peso grande demais. Mais uma vez, como e quanto eles estão gerando de fluxo de caixa para o negócio será uma resposta necessária para alguns itens como máquinas e equipamentos.

As contas a pagar também tornam-se fator determinante num cenário de adversidades. Isso porque endividar será cada vez mais caro, podendo levar a inviabilização do negócio. As obrigações trabalhistas são altas e devem ser priorizadas. As operações com bancos devem ser bem estudadas.  O passivo comercial se presta a negociação mas com um certo limite definido por cada situação. Por isso, é trabalhoso e imprevisível. E o passivo tributário, apesar de se prestar a parcelamentos, também é bastante oneroso. Por isso, somente gere contas a pagar que possam ser quitadas no vencimento. Do contrário, verá a sua rentabilidade se esvair pelo ralo dos juros.

Decidir rápido e com fundamento em números será ainda mais forçoso. Para isso, os relatórios e demonstrativos gerenciais, vindos de sistemas ou não, são peças sem as quais o amadorismo acaba por imperar. Ter indicadores que norteiem os gestores e as equipes nas suas ações do dia a dia, é uma providencia inteligente e crucial. Prospectar e descobrir oportunidades no meio da crise também. Ela exige mais desempenho, mais planejamento, mais criatividade, mais coragem para os desafios. A crise exige de nós que saiamos da zona de conforto. Que mudemos para melhor.

Diante de um cenário pessimista, muitos podem até pensar que estamos perto do fim.  Podemos nos perguntar porque não paramos com tudo, recolhemos nossos pertences e nos mudamos para um local menos arriscado. Podemos nos perguntar por que investir e empreender em um ambiente tão contrário. Creio que a teimosia empreendedora explica. Um espírito de persistência e superação que permeia a inciativa privada, e que é inerente a condição humana. Se o Brasil acabar, a gente faz outro. Com trabalho e empreendedorismo.

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