O MERCADO SOMOS NÓS



Recentemente, estava eu voltando da viagem de atendimento a um cliente, quando ouvi no rádio um pedaço de entrevista que me chamou a atenção. Imagino eu, que tratava-se de um produtor cinematográfico brasileiro, comentando sobre as produções nacionais. Ele falava que certa vez, observou que a maioria das estreias nas salas em São Paulo, eram de um mesmo filme, aqueles que rendem grande bilheteria, deixando pouco espaço para as produções menos comerciais e locais. Lucidamente, um dos entrevistadores perguntou como fazer para mudar esta situação, já que isso se dava pela maior procura do público. Sem responder diretamente, o entrevistado discorreu sobre um assunto paralelo, exemplificando que em certos canais pagos de assinatura existe uma lei que obriga-os a apresentar produções nacionais e que devemos nos perguntar se o público tido como menos maduro frequenta mais os cinemas, porque os filmes são mais superficiais ou os filmes são mais superficiais porque atendem a este público. Mesmo não defendendo isto de maneira explícita, para mim ficou nas entrelinhas que a solução seria um “poder maior” (certamente o estado) intervir para que as salas de cinema passem mais filmes nacionais. Também ficou a impressão de que aqueles que assistem os filmes de grande bilheteria, seriam menos inteligentes e cultos, do que aqueles que preferem outro estilo. Este fato aparentemente simples, levou-me a uma reflexão que divido com vocês neste post.

Apesar de não parecer, esta conversa possui um assunto subliminar sobre mercado, intervenção, liberdade, autoritarismo, eficiência e protecionismo. As salas de cinema são um mercado como qualquer outro.  Ali as pessoas compram o que desejam comprar, seja diversão, reflexão, aprendizado ou arte.  Também compram aquilo que é ofertado. A relação de oferta e demanda é mutuamente complementar. Quando o mercado é deixado o mais livre possível, ele tende a comtemplar a eficiência de quem oferta e uma maior amplitude de quem procura. Funcionando como um sistema complexo, o mercado se regula, se ajusta, se compensa e evolui. Não tenho dúvidas que os filmes de maior bilheteria são aqueles que as pessoas desejam assistir, mesmo considerando todo investimento em marketing promocional nos mesmos. Este alto investimento, já indica esta tendência, pois ninguém em sã consciência e em condições normais, investe alto naquilo que não tem possibilidade de retorno. A preferência atual daqueles que vão ao cinema, e vão sem que ninguém os obrigue, pode e deve ser compreendida pois reflete aspectos da atualidade, mas interferir nisso diretamente parece-me algo mais bizarro do que algumas produções que se dizem elaboradas e dirigidas para os ditos inteligentes.

Um filme é produzido a partir da ideia e da iniciativa de algumas pessoas. Certamente um grupo muito menor do que aqueles que o assistem. Estes, apesar do olhar crítico de alguns, sabem exatamente o que lhe agrada ou não, quando o assunto é a delicada alquimia entre roteiro, imagem, som e mensagem.  Imaginar que a maioria é tola, traz no fundo uma pretensão de ser melhor que os demais, de não ser igual, de discriminação em vez de diferenciação. Seria muita pretensão dizer que 20 pessoas são mais capazes de julgar o que é bom ou ruim em um filme do que 20 milhões.  E por fim, desejar que esta grande maioria financie através do estado, produções que um pequeno grupo realize, e imaginar que através deste mesmo estado, se possa obrigar a maioria a assistir estas produções, é no mínimo uma manipulação, para não falar em outras coisas piores, tanto na esfera econômica como política.

Para conseguir seus objetivos pessoais, muitos querem atalhos. Querem usar do poder e da força para verter os outros à sua conveniência, usando o estado para tal. Melhor seria, ter uma ideia interessante, arregimentar financiamento, empreender e arriscar, agradar os clientes e obter os bons resultados disto, em vez de apoderar-se do que não é seu. Deixem os mercados funcionarem, que eles abastecerão as suas necessidades, com uma multiplicidade de opções que o maior dos sábios do mundo, é incapaz de imaginar. Os mercados são as pessoas. O mercado somos nós.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

PROBLEMAS SISTÊMICOS PEDEM SOLUÇÕES ESTRUTURADAS

O QUE É A PATOCRACIA

QUEM CARREGA O PIANO ?